Gente

Um novo tempo

Um novo tempo

Por Antonio Ferreira Jr. / Fotografias Denílson Machado / MCA Estúdio

  • KAZA

    Drica é uma mulher plural, daquelas que não cabem em si e acabam transbordando na gente. Impossível ficar impune ao seu bom humor, seu carisma, sua força – muito menos não ser respingado pela própria luz que brota dela. É alguém que não gosta de brilhar sozinha, nunca. A conheci mais de dez anos atrás e a convivência na coxia acabou virando algo muito maior. 

    O ano era 2002 e eu fazia os cenários de um espetáculo protagonizado por ela, um grande musical engenhoso e com um cenário muito complexo que exigia a minha presença full time. Bati o olho pela primeira vez e vi que se tratava de alguém muito especial, tipo paixão à primeira vista. Na época ela morava neste mesmo apartamento carioca, mas logo depois se mudaria para uma grande casa na Avenida Niemeyer, projetada pelo pai, o arquiteto Gustavo Moraes E lá fui eu me encarregar do recheio da morada. 

    O exercício da profissão por si só demanda uma aproximação estreita com o cliente, uma leitura biográfica que deve ser convertida em espaço físico com precisão cirúrgica. Projetar o território do outro é compreendê-lo enquanto ser humano e evitar toda sorte de clichês. 

    Kaza

    Quando se cria algo para amigos, essa troca é muito mais fluída, natural e verdadeira – e chega ser uma covardia não acertar a mão. Com a Drica garimpei lojas, feiras, antiquários. Sem esforço. Isso porque ela é moça fina, cult, cool, carregada de referências – e sabe bem o que quer. Pinçamos os móveis brasileiros que ela adora, com os toques de design emocional que faziam a sua cabeca. Organizamos seus livros, suas obras de arte, fotografias (outra de suas paixões). 

    Ela foi muito feliz ali – e nós, os amigos, também. Festejamos vários momentos inesquecíveis, e um deles foi achegada de seu filho Mateus, que considero meu afilhado. Sobe o pano. Vieram então alguns percalços e seu problema de saúde, tão devastador para ela como para seus espectadores de primeira fila. Mas nem o imprevisto no roteiro azedou a comédia privada desta humorista por natureza. 

    Claro que foram tempos difíceis de muita luta e expectativa, mas ela nunca fez drama de nada e sempre soube rir da proópria história. Encarou o revés pessoal como uma fase de transição, uma prova do destino. E tinha certeza sobre o desfecho – claro que a mocinha vence no final. De volta à ativa, mais bonita, mais forte e mais talentosa, Drica continua grande, mas sua vida cabia em uma casa menor. 

    E lá fomos nós colocar as mãos na massa para transformar o antigo apartamento em algo prático, funcional e charmoso. Comecamos o processo separando o essencial, sem deixar de lado suas obras de arte, alguns móveis trazidos de Londres (ela viveu dois anos lá) e objetos com os quais ela se identificasse. Essa nova empreitada incluía o Mateus. Criamos uma suíte para esse ser lindo, amoroso e que enche a vida da Drica de alegria – e a nossa também. 

    Organizamos os livros em um pequeno home-office, uma mesa de jantar que garimpamos juntos, um tapetão colorido com o astral dela, entre outras coisas mais. É nesse mundo mais compacto que hoje mora minha irmã e onde ela recebe, faz pequenas reuniões para leitura de texto e encara a labuta do cotidiano. E já estou me preparando para a próxima transição. Afinal, o Mateus está crescendo e ela já avisou que daqui a pouco estaremos montando um canteiro de obras em outro lugar.

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