Por Flávio Nogueira / Fotos Alexandre Pirani/Divulgação
KAZA invade o ateliê paulistano de Henrique Oliveira, um dos artistas plásticos mais expressivos da nova geração, que ganha exposição panorâmica de sua carreira no Centro de Artes Hélio Oiticica, no Rio, antes de aterrissar no Palais de Tokyo, Paris
O dia é um daqueles típicos de São Paulo. Apesar da primavera ser a estação oficial, o vento gelado e uma fina garoa insistem no céu cinza da cidade. Henrique Oliveira, 39 anos, senta no velho sofá e dispara: “Não dá para conversar sem tomar um café, né? Vou passar um”. Kaza visitou seu ateliê, na Lapa, zona oeste da capital, um galpão de 120 metros quadrados, onde espátulas, caixas e tubos de tintas se amontoam pelas paredes numa bagunça paradoxalmente organizada. Enquanto a água ferve, ele conta que acaba de chegar da ArtRio e que está se preparando para sua segunda residência em Paris, onde fará uma mostra no pomposo Palais de Tokyo, no começo de 2013. Mas antes fará sua primeira retrospectiva no Centro de Artes Hélio Oiticica, no qual esculturas de parede feitas entre 2008 e 2012, sob a curadoria de Vanda Klabin, ficarão expostas a partir de 1º de dezembro, finalizando com chave de ouro o calendário das artes no Brasil.
Integrante da seleta safra de jovens artistas que estão despontando, Henrique Oliveira encabeça hoje a lista dos talentos que cada vez mais têm suas obras aquilatadas. Não é para menos. Ao mergulhar em seu espaço criativo é possível entender como ele se tornou um artesão de muitas possibilidades estéticas. As misturas de matérias-primas como troncos de velhas árvores, restos de madeiras garimpadas nas ruas, tintas, pincéis e outras centenas de ferramentas, traduzem muito seu espírito e a essência de suas obras. Os relevos de parede que começaram com a série Tapumes, em 2003, a cada ano ganham contornos e plasticidades únicas que se tornaram suas marcas registradas. As esculturas saltam aos olhos, não apenas por suas ondas orgânicas, mas principalmente pelas texturas que ele explorou além das telas, desenvolvendo cenários superdimensionados. “No primeiro momento, usava esses conceitos como uma intervenção na arquitetura, onde as formas eram dadas em função do espaço instalado. Daí descobri a flexibilidade de alguns materiais e com o tempo fui aprimorando essas curvas e instalações”, diz. As inspirações chegam de diferentes vertentes: pintores do calibre de William Turner, Gerhard Richter, Iberê Camargo e músicos como Bob Dylan e a banda Ramones, mas elas vão além da própria arte e chegam a veredas quase bizarras. Uma edição inglesa de medicina com diversas metástases de câncer, por exemplo, entra na sua bagagem de instrumentos. Resultado de um desses alentos é Prolapso das Ursulinas – uma obra que lembrava muito o desenvolvimento de um tumor: começava na rua e invadia espaço adentro de uma galeria de Linz, na Áustria. “Mas os significados das minhas obras são abertos. Em Prolapso, por exemplo, o aspecto é natural, pode parecer uma espécie de vegetação, uma interferência da natureza”, explica.
Sua história é cheia de inquietações, como a alma de qualquer outro artista. Nascido em Ourinhos, interior de São Paulo, aos três anos, ele já estava matriculado em uma escola aprimorando o dom natural para os desenhos. Na adolescência, cogitou ser cartunista e até fazer arquitetura, mas acabou por prestar vestibular para comunicação social e se frustrou nas agências de publicidade. Irrequieto, decidiu montar um pequeno espaço para pincelar seus primeiros quadros. No final da década de 1990 veio para Sampa, entrou na Escola de Comunicação e Arte da Universidade de São Paulo, onde suas habilidades ganharam força e uma personalidade incomum que começa a entrar para a história da arte contemporânea no Brasil – assim como fez a turma da escola modernista no século passado. Antes que o café esfrie, Henrique promete ganhar o mundo.