De trás para frente
Paraíso Tropical
No litoral paulista, as fachadas invertidas descortinam a vista da praia e o paisagismo de Alex Hanazaki, no projeto bem bolado dos arquitetos Patricia Bergantin e Michel Stein Valente
POR CYNTHIA GARCIA FOTOS LEONARDO FINOTTI
AQUI, NESSA CASA DE PRAIA, há uma questão para acadêmicos fazerem vistas grossas. Para os autores do projeto, o casal de jovens arquitetos formados no Mackenzie, Patricia Bergantin (que também atua como decoradora e assina os interiores) e Michel Stein Valente (também ilustrador para o mercado imobiliário), ambos à frente do escritório Patricia Bergantin Arquitetura, fundado em 2009, o conceito de fachada principal, geralmente a entrada ou o acesso, foi invertido. Nesse projeto, eles denominam fachada principal a posterior, ou seja, a parte de trás, dos fundos. “A planta é inteiramente voltada para trás, a área de lazer, que inclui a parte social aberta para o jardim e a piscina, emoldurados pela Mata Atlântica. Foi a partir daí que desenvolvemos todo o projeto, implantado para usufruir do verde. Então, não há dúvida que essa é a fachada principal, não é mesmo?”, conclui Michel com convicção. Por natureza, o verdadeiro arquiteto é um transgressor, como foram os profissionais da prancheta que ambos citam como seus ícones: os contemporâneos Álvaro Siza, Souto de Moura e Renzo Piano, e os papas do modernismo Mies Van der Rohe (1886-1969) e Frank Lloyd Wright (1867-1959), na essência, todos transgressores. Em 1931, Wright veio até o Brasil dar sua chancela ao movimento modernista brasileiro, na época, uma tomada de posição revolucionária de nossos intelectuais que lutavam para introduzir os novos conceitos arquitetônicos unindo-os à nossa cultura brasileira para desbancar as premissas do art nouveau, art déco e dos estilos historicistas vigentes. Deu tão certo que nossa arquitetura moderna figura entre as melhores do mundo.
Situado no santuário ecológico paulista de Iporanga, a poucos metros da cachoeira e da praia, esse refúgio é de dois casais, ambos com filhos adolescentes, unidos pelas esposas, irmãs e empresárias que trabalham juntas e curtem o mesmo estilo de vida. Desde 1996, dividiam uma casa no mesmo condomínio que não os satisfazia, principalmente na parte social que não dava vazão aos almoços e jantares que essa grande família adora preparar nos fins de semana. Após a compra de dois lotes “filés mignons” e passadas as reuniões com os arquitetos, seguidas de dois anos de construção, em 2011, a nova casa inaugurou com o perfume da mata, a brisa do mar e todos os confortos sonhados por eles. O paisagismo ficou a cargo do aclamado Alex Hanazaki, que soube com sua sensibilidade artística explorar com delicadeza e conhecimento a imensa paleta tropical da flora nativa, entre elas, várias espécies de palmeiras, bromélias, helicônias, orquídeas e o palmito-juçara, que a Associação dos Proprietários de Iporanga (Sasip) luta para preservar.
Com área construída de 770 metros quadrados em terreno de 2.500 metros quadrados, a casa de dois pisos foi implantada em “L” em apenas um dos lotes, reservando o outro para o rico bioma da Mata Atlântica. O consumo do ar-condicionado nos dormitórios, no piso superior e no térreo, apenas no home theater, é contrabalançado pela sustentabilidade dos painéis de aquecimento solar, da irrigação do jardim com água de reúso e da ventilação cruzada que usufrui do microclima úmido e do espelho-d’água de 45 metros quadrados da piscina, contribuindo para o conforto térmico dessa generosa casa praiana.
O projeto, o primeiro construído e pautado nas ideias e ideais de Patricia e Michel, está rendendo frutos. A dupla de jovens companheiros de profissão e de vida – eles têm um casal de filhinhos – está com outros dois projetos na paradisíaca Iporanga. Que os bons ventos os levem!